Em 1958, os franceses após crises sucessivas, seguidas de instabilidade política, de incertezas com as guerras de independência das colônias do norte da África, foram buscar no pequeno vilarejo, Colombey-les-Deux-Èglises, o velho general Charles De Gaulle. O recatado herói nacional da Segunda Guerra Mundial, foi convidado a chefiar o governo. Dotado de plenos poderes, convocou Constituinte, dotou a França de nova Constituição, até hoje vigente, deu-lhe estabilidade e a configuração institucional atual. De lá para cá, republicanos e socialistas reversavam-se no governo. A escrita desfez-se na última eleição presidencial. Ficaram para a disputa do segundo turno Marine Le Pen, do nanico partido Frente Nacional e Emmanuel Macron, de outro pequeno partido, o”En Marche, ” o provável vencedor da segunda rodada de 7 de maio.
O caso da França é emblemático da crise de representação atravessada pelas democracias, em que se inclui o Brasil. Os partidos políticos não representam a sociedade, que não se vê participando dos atos de governo, seja no Legislativo ou no Executivo. A economia depende de estabilidade política para deslanchar, enquanto o país paralisa pela ineficiência dos serviços públicos, a desindustrialização, o desemprego em massa.
Há quem confunda a reforma política com a eleitoral, esta última bastaria com a aprovação da cláusula de barreira e a proibição de coligação nas eleições proporcionais. Ledo engano. Na origem da crise está o refazimento do pacto político. Este se dará pela revisão da atual Constituição, pela convocação de Constituinte exclusiva. Mas é fato, os remendos eleitorais não serão suficientes para enfrentar a crise do divórcio entre o Estado e a sociedade.
Entre nós não há heróis nacionais, figuras como o general De Gaulle, de elevado espirito patriótico, demonstrado em 1969, em que após plebiscito, comprovado que o povo não mais estava de acordo com suas diretrizes de governo, voltou para o recato de sua casa em Colombey-les-Deux-Èglises. Não lhe faltaram a grandeza de estadista e o espirito cívico e patriótico.
No caso brasileiro não se pede tanto, é bom mesmo que o povo seja o protagonista principal, se requer o mínimo de espirito patriótico, para colocar os interesses do país, do regime democrático, acima de pequenos apetites eleitorais, a serviço da manutenção do poder e de seus privilégios a qualquer preço.
Como prosseguir com mandatários sem credibilidade e leis suspeitas de terem sido aprovadas para atender a conveniências de determinadas empresas e empreiteiras. As primeiras condições para o exercício de funções públicas são confiança e credibilidade.
A defesa da atual Constituição transita por sua revisão, ou convocação de Constituinte exclusiva para a partir dela refazer o pacto político entre a sociedade e o Estado.
Não é adequado criminalizar a política, substituindo-a por gestores e tecnocratas. Trata-se de atividade nobre quando a serviço efetivo dos interesses coletivos. O que vem se designando como tal, nada tem a ver com a verdadeira política. A pretexto de propósitos eleitoreiros, esconde-se a ação criminosa de bandos.
Enquanto isso a Diretora –Gerente do Fundo Monetário Internacional-FMI, a francesa Christine Lagarde, alardeia que o Brasil virou a página, isto é, vem aplicando por inteiro a receita dos bancos: arrocho fiscal, contenção de despesas orçamentárias, redução dos direitos sociais.
O termômetro é a imprensa, que trata apenas dos projetos do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, do teto de gastos e das reformas trabalhista e previdenciária, sem prévia avaliação dos custos socais e políticos resultantes.
Os franceses deram nas urnas respostas a republicanos e socialistas alternando-se no poder desde a proclamação da República gaullista em 1958.Eles não foram capazes de satisfazer as aspirações do eleitorado, rejeitados nas urnas, substituídos pela extrema direita de Le Pen e pelo centrismo de Macron. Mais que isso, manifestaram insatisfação com o sistema político- eleitoral. É apenas o começo. Precisamos aprender lições com a velha França, fonte da democracia, como hoje se pratica, dos Direitos do Homem e do Cidadão.
Na República, o que deve prevalecer é o interesse público.
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