30/06/2016

A SAÍDA INGLESA

Autor: João Batista Ericeira é professor universitário e sócio majoritário de João Batista Ericeira Advogados Associados

Muitos antes de o Brasil ser descoberto, em 1215, os ingleses fizeram o rei João Sem Terra jurar a Magna Carta, respeitando a vida, a liberdade e a propriedade, submetendo-se a Declaração de Direitos, garantindo as prerrogativas dos nobres cidadãos. Na mesma ocasião, criou-se o Tribunal do Júri, o Habeas-Corpus, instituiu-se a prerrogativa de unicamente o Grande Conselho criar impostos. Eram os primeiros passos da democracia que se instalaria na ilha dos anglo-saxões. Na trajetória histórica houveram revoluções contra as tiranias, como a gloriosa de 1688, depondo Jaime II, entregando a gestão do Exército ao Parlamento, aprovando a Bill of Rights, base do constitucionalismo do mundo ocidental.

Semana passada, os ingleses consultados em plebiscito, votaram a favor da saída da União Europeia, bloco constituído no continente, sob a liderança da Alemanha e da França, consolidando a unificação política e monetária, a partir da cessão de parte da soberania de seus membros. A Inglaterra houvera aderido parcialmente a União, mas não abriu mão da sua moeda, a libra. Desde os romanos, a moeda representa a soberania do país. Não esqueçamos da resposta de Jesus a propósito da separação entre a política e a religião: “dai a César o que é de César, a Deus o que é de Deus”.

A questão da saída inglesa não é unicamente política. As correntes migratórias vêm criando dificuldades na vida pública do país, utilizando-se da educação, saúde e segurança. É crescente a massa de pessoas oriundas de ex-colônias inglesas que para lá dirigem-se, a procura de empregos e dos serviços de saúde, educação e previdência de qualidade. A competição, o medo dos mais velhos, concorrem para o surgimento do nacionalismo xenófobo que se estende também ao continente. Os colonizadores pagam os pecados do colonialismo, recebendo os filhos do colonizados que se dirigem para a metrópole.

A repercussão da saída inglesa espalhou-se por todos os mercados da aldeia global ocidental. No Brasil, a mídia nacional convocou analistas para falarem sobre as repercussões do principal fato da semana. Dentre eles, o ex-ministro e czar da economia da ditadura Delfim Neto, que cuidou de lembrar não se tratar de apocalipse ou juízo final, alguns ganharão e outros perderão, como sói acontecer em episódios dessa natureza, não se justificando tamanho nervosismo dos agentes financeiros, excessivamente preocupados com as oscilações das bolsas.

O embaixador da Inglaterra lembrou a solidez da economia do seu país, a quinta do mundo, com status semelhante a brasileira, insinuando que talvez fosse até uma oportunidade para o desenvolvimento de novas e boas parcerias. Ou seja, não há motivos para maiores preocupações.

 Diplomacia à parte, não custa lembrar: as relações anglo-brasileiras são promissoras desde a independência de 1822, assegurada por empréstimo do Tesouro da Inglaterra, garantido por privilégios aduaneiros e favores nas importações britânicas, que prosseguiram ao longo do Segundo Império, passando para a República.  A partir da Segunda Grande Guerra Mundial a hegemonia transferiu-se para o Estados Unidos, que assumiram o lugar da Inglaterra.

Como sempre, historicamente o Brasil exporta produtos agrícolas e minerais em troca de artefatos industriais e tecnológicos.  Alteraram-se os nomes, chamam-se agora de commodities com sojas e minerais, cambiados por insumos fundamentais para um parque industrial obsoleto, à exceção dos aviões da Embraer e de instrumentos para a exploração do petróleo. A petrolífera nacional está ameaçada pela corrupção e a má gestão. A empresa é a espinha dorsal da economia nacional, urge buscar saídas para a sua recuperação.

O plebiscito da Inglaterra comprova o quanto está interligada a economia internacional, dando o exemplo de que não obstante a globalização permanecem intactos os valores nacionais. O perigoso é transformá-lo em nacionalismo jacobino, em prejuízo dos universais Direitos Humanos. É perigosa a preponderância do financeiro sem levar em conta as necessidades sociais. É justo que a democrática ilha receba os imigrantes, os acolham, filhos que são do colonialismo que tantos lucros deu ao Império onde o sol não se punha.

A política, no reino de sua majestade está podre, como em todo o mundo. Por lá ninguém acredita nos políticos e nos partidos. Os dois principais, conservador e trabalhista, enfrentam profundas divisões internas e crise de lideranças. Mas é fato, pela experiência e antiguidade, devotam enorme respeito pela vontade popular. Lição que devemos aprender com a saída inglesa, independentemente do juízo de valor que fizermos.

 

http://www.ericeiraadvogados.com.br/

 

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