A Comissão de Conciliação, Mediação e Arbitragem da Seção do Maranhão da Ordem dos Advogados do Brasil, emite a presente Nota, a fim de proporcionar orientações aos advogados e profissionais da advocacia sobre condutas a serem ponderadas no âmbito de resolução de litígios e conflitos, a fim de mitigar efeitos e reflexos negativos da pandemia do COVID-19 (“Pandemia do COVID-19” ou “Pandemia”).
Diante da Pandemia provocada pelo COVID-19, tem-se verificado uma situação típica de tempos de crise em escala global: contratos têm sido rescindidos, adiados ou renegociados; empresas e negócios estão passando por diversas situações de inadimplência, com um importante aumento dos pedidos de recuperação judicial; funcionários têm perdido seus empregos; empresas estão adotando medidas de isolamento social e trabalhos a distância; entre outros.
Essa situação, como é de conhecimento dos profissionais da advocacia, é uma grande porta de entrada para litígios em escala global, desde os mais simples aos mais complexos, e implicará no aumento do volume de controvérsias. Isso pode levar a um congestionamento do Poder Judiciário. Para evitar uma situação de colapso, tal como se quer evitar no sistema de saúde, é imprescindível que a advocacia coopere.
É de se reconhecer que o acesso à justiça deve ser entendido como acesso à ordem jurídica justa[1] e que há, além do recurso ao Judiciário, diversos métodos eficientes de resolução de conflitos à disposição da sociedade para trazer melhores resultados em termos de tempo e custos, principalmente para as empresas que tanto sofrem neste momento excepcional. É dever dos advogados trabalhar para tornar o uso do Poder Judiciário mais sustentável, utilizando-se deste apenas quando necessário, em atenção inclusive à ODS 16 da ONU de paz, justiça e instituições eficazes.
Hoje, mais do que nunca, o advogado deve levar em consideração que seu papel vai muito além da sua tradicional função perante um juiz ou tribunal. Em especial diante da atual Pandemia do COVID-19, a sua função de interveniente e incentivador de meios adequados de solução de controvérsias (as ADRs – Alternative Dispute Resolution e ODRs - Online Dispute Resolution) deve ser ainda mais prestigiada e incentivada, notadamente pelo que dispõe o Código de Ética e Disciplina da Ordem dos Advogados do Brasil – OAB e da Advocacia, que prevê que é dever do advogado estimular, a qualquer tempo, a conciliação e a mediação entre os litigantes, prevenindo, sempre que possível, a instauração de litígios (art. 2º. Parágrafo único. VI).
Advocacia utilizando métodos consensuais também é advocacia.
Para cooperarmos com a administração da justiça, espera-se do advogado uma postura assertiva, dinâmica, estratégica, propositiva, com habilidades de negociação em favor dos interesses de seus clientes a fim de solucionar os problemas pelos quais estes passarão em decorrência da grave crise econômica e social derivada da Pandemia do COVID-19.
O profissional da advocacia, por ser indispensável à administração da justiça – tal como estabelece a Constituição Federal -, presta serviço público e exerce função social[2] . Assim, mais do que nunca, encontra-se em posição extraordinária de analisar a situação de seus clientes e das empresas das quais compõem as equipes jurídicas de forma a minimizar, ou até mesmo evitar, a maior propagação dos efeitos negativos que calamidade da Pandemia do COVID-19, em especial aqueles necessários à assegurar a sustentabilidade do uso do poder judiciário e dos gastos com litígios.
Mesmo diante de um cenário tão peculiar como este, diversos institutos da advocacia mostram-se pertinentes à auxiliar e mitigar os efeitos desta crise. Este é o momento, portanto, para a advocacia incentivar a utilização de meios de solução de controvérsias, como a Mediação, Conciliação e Negociação.
MEDIAÇÃO assim entendida como “a atividade técnica exercida por terceiro imparcial sem poder decisório, que, escolhido ou aceito pelas partes, as auxilia e estimula a identificar ou desenvolver soluções consensuais para a controvérsia” . Vale observar que a mediação é ideal para relações duradouras, já que o profissional capacitado, independente e imparcial que é o mediador “atuará preferencialmente nos casos em que houver vínculo anterior entre as partes, auxiliará aos interessados a compreender as questões e os interesses em conflito, de modo que eles possam, pelo restabelecimento da comunicação, identificar, por si próprios, soluções consensuais que gerem benefícios mútuos”, tudo nos termos dispostos em lei, notadamente artigo 1º, parágrafo único da Lei 13.140/2015 e art. 165, parágrafo 3º do CPC.
Já́ a CONCILIAÇÃO ideal para relações passageiras, já́ que o conciliador “atuará preferencialmente nos casos em que não houver vínculo anterior entre as partes, poderá sugerir soluções para o litígio, sendo vedada a utilização de qualquer tipo de constrangimento ou intimidação para que as partes conciliem” , como dispõe a lei, art. 165, parágrafo 2º do CPC.
Quanto à NEGOCIAÇÃO esta é uma técnica que deve ser conhecida e utilizada por todos na mediação e conciliação, principalmente pelos advogados, pois “admite-se a aplicação de técnicas negociais, com o objetivo de proporcionar ambiente favorável à autocomposição”, nos termos do art. 166, parágrafo 3º. do CPC
A ARBITRAGEM é um método de resolução de conflitos, no qual as partes definem que uma pessoa ou uma entidade privada irá solucionar a controvérsia apresentada pelas partes, sem a participação do Poder Judiciário. Caracterizada pela informalidade, embora com um procedimento escrito e com regras definidas por órgãos arbitrais e/ou pelas partes, a arbitragem costuma oferecer decisões especializadas e mais rápidas que as judiciais. A sentença arbitral tem o mesmo efeito da sentença judicial, pois é obrigatória para as partes envolvidas na controvérsia. Por envolver decisões proferidas no âmbito de um mecanismo privado de resolução de controvérsias, a arbitragem desponta como uma alternativa célere à morosidade do sistema judicial estatal, nos termos do art, 515, VII, do CPC/2015, sendo definitiva e irrecorrível, como dispõe os art. 18 e 31 da Lei de Arbitragem.
Os meios consensuais mostram-se essenciais e pertinentes neste momento, tanto para otimizar os litígios que se encontram em andamento sob seus cuidados, como também para guiar e assessorar clientes em virtude de contendas que surjam em decorrência da Pandemia do COVID-19 e todos podem também ser utilizados em ambiente online. A utilização da mediação, da conciliação e negociação não apenas poderá reduzir drasticamente o volume de litígios, como também tem o poder de proporcionar às partes envolvidas uma solução mais amistosa, mais imediata e mais satisfatória aos interesses comuns, com reciprocidade e menos custos envolvidos, além de maior controle quanto ao seu desfecho e confidencialidade para proteger a imagem e informações sensíveis.
Os meios consensuais, que são instrumentos a serviço da atividade e das funções da advocacia, mostram-se como ferramentas essenciais ao combate aos efeitos deletérios da pandemia, sejam econômicos ou sociais. Trata-se do exercício mais amplo do dever de colaboração entre as Partes e das mais relevantes funções que o advogado por exercer para cooperar na administração da justiça. Assim, os recursos a esses meios consensuais passam a exercer papel fundamental do advogado para o combate aos reflexos negativos da pandemia do COVID-19.
Resolver os conflitos sem recorrer ao Poder Judiciário utilizando métodos consensuais também é advocacia.
Os advogados podem utilizar legitimamente a mediação, conciliação e negociação nas esferas privada e da Administração Pública, por meio da Câmara Brasileira de Mediação e Arbitragem Empresarial (CBMAE) conveniada a OAB-MA, que possui plataforma de resolução de conflitos online (www.cbmae-ma.com.br), que neste período de pandemia não tem cobrado pela taxa de cadastro.
Os acordos promovidos nestas esferas podem constituir títulos executivos extrajudiciais, nos termos do art. 784, do CPC e do art. 20 da Lei 13.140/2015 e como a Câmara é credenciada ao TJMA, tal acordo, pode ser levado a homologação judicial via PJe, se assim as partes desejarem, porém não obrigatório.
Assim, neste momento, sugere-se, como forma de contribuir e prestigiar o Poder Judiciário: a) utilizar estes institutos no âmbito privado e público; b) levar para homologação judicial apenas os acordos em que realmente for imprescindível esta medida.
Tanto para evitar o desnecessário acúmulo e congestionamento das Câmaras e do Judiciário de demandas que virão a surgir em decorrência de inadimplementos relacionados à Pandemia, quanto como mecanismos de mitigação de possíveis efeitos econômicos nefastos decorrentes da litigância em massa, hoje, mais do que nunca, com estas ferramentas de autocomposição, o advogado desempenha papel fundamental no combate aos reflexos jurídicos indesejados da crise econômica e social decorrentes da calamidade pública de saúde provocada pelo COVID-19.
Assim, recomenda-se que utilizem os meios consensuais, buscando uma solução da controvérsia antes de adotar qualquer medida junto ao Poder Judiciário, principalmente em situações em que envolvam relações jurídicas de longo prazo, minimizando os efeitos adversos de uma disputa judicial.
A OAB-MA, por esta Comissão, coloca-se à disposição para auxiliar todos os profissionais da advocacia no presente momento, em especial para o incentivo à promoção da mediação, conciliação e negociação a fim de solucionar litígios em trâmite e os decorrentes dos efeitos dessa Pandemia.
COMISSÃO DE CONCILIAÇÃO, MEDIAÇÃO E ARBITRAGEM DA OAB-MA
São Luis-MA, 04 de maio de 2020.
[1] WATANABE, Kazuo, Acesso à Ordem Jurídica Justa, Editora Del Rey, 2019.
[2] Conforme art. 2º do Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil.